quinta-feira, 8 de dezembro de 2011

Resumo filosofia antiga


Filosofia da Grécia Clássica
            Prof. Esp. Eliseu Santos Lima
            RESUMO SOBRE FILOSOFIA ANTIGA DE TALES ATÉ PLATÃO          

A Escola Jônica
A Escola Jônica recebe esse nome da Jônia, colônia grega da costa ocidental da Ásia Menor. Os seus representantes ilustres são: Tales de Mileto (624-546), Anaximandro (611-546), Anaxímenes (586-525) e Heráclito (535-470).

             Contexto 
Os pensadores pré-socráticos se ocuparam fundamentalmente com a origem do mundo (cosmologia) e as causas das transformações na Natureza.
Não há necessidade de tratarmos da importância dos primeiros filósofos, ainda que hoje possa parecer, em algumas ocasiões, excessivamente ingênua.
“A filosofia nascente pretendia superar as interpretações míticas, rejeitando o sobrenatural e a interferência dos agentes divinos na explicação dos fenômenos da natureza. Trata-se da natureza dessacralizada (que deixa de ser sagrada) pela procura da racionalidade do universo” (ARANHA. M. L. de; 1989, p. 40).

Tales de Mileto (624-546 a.C.)
Segundo Aristóteles ele é identificado como fundador da filosofia, e sua doutrina baseia-se na água ou o úmido como elemento primordial[1] de todas as coisas; para não sofrer transformações e permanecer inalterada, a água deveria ser o elemento eterno. A afirmação de que tudo é feito de água deve ser encarada como uma hipótese científica, e não uma tolice se considerarmos o contexto histórico e o início do desenvolvimento do pensamento racional.
Tales é considerado também um físico[2] por preocupar-se com os fenômenos naturais e da natureza como um Todo Único. Observou que o calor necessita de água, a secagem total de um corpo significa a morte, a natureza é úmida, os gérmens são úmidos, os alimentos contêm seiva e concluiu que tudo é água (Possui natureza úmida). A água é um elemento físico que é constante em todas as coisas, ou seja, o princípio unificador de todos os seres.
Aristóteles supõe que a observação de Tales sobre o princípio vital levou-o a conclusão de que todas as coisas se nutrem do úmido e que o calor é gerado a partir da umidade e por ela se conserva.

E afirmam alguns que ela (a alma) está misturada com o todo. É por isso que, talvez, também Tales pensou que todas as coisas estão cheias de deuses. Cf. Platão Leis, X, 899 B. Parece também que Tales, pelo que se conta, supôs que a alma é algo que se move, se é que disse que a pedra (ímã) tem alma, porque move o ferro (Aristóteles: da Alma)[3].

Comentário Nietzschiano
A filosofia grega parece começar com uma idéia absurda, com a afirmação: a água é a origem e a matriz de todas as coisas. Será mesmo necessário deter-nos nela e levá-la a sério? Sim, e por três razões: em primeiro lugar, porque essa afirmação nos transmite algo sobre a origem das coisas; em segundo lugar, porque o faz sem imagem e fabulação; e enfim, em terceiro lugar, porque nela, embora em apenas estado de crisálida (em gestação), está contido o pensamento: ‘Tudo é um[4]’.


            Anaxímenes (585-525 a.C.)
            Anaxímenes nasceu, provavelmente, n ano 585 a.C., e sabe-se que morreu durante a 63º Olimpíada, entre 528 e 525 a.C. De sua vida nada mais é conhecido.
Para Anaxímenes o princípio vital é o ar e todas as coisas seriam ar condensado ou rarefeito[5] em vários graus. A alma é ar; o fogo é ar rarefeito. Quando condensado, o ar em transforma-se primeiro em nuvens, depois água, e se condensar ainda mais será terra, e por fim, pedra. A rarefação e condensação do ar formam o mundo.
Para Anaxímenes, o ar representa um elemento invisível e imponderável, quase inobservável e, no entanto, observável: o ar é a própria vida, a força vital, a divindade que “anima” o mundo[6].

HERÁCLITO (540-470 a.C.)
Temos de considerar este filósofo como um jônio posterior. As datas do nascimento e da morte de Heráclito são desconhecidas. Sabe-se, porém, que atingiu o auge de sua existência na época da 69º Olimpíada, entre 504 e 500 a.C. isto é suficiente para situá-lo uma geração após Xenófanes, ao qual se opôs, e uma geração antes de Parmênides, o seu principal opositor. De sua vida, pouco se conhece; supõe que tenha pertencido à aristocracia de Éfeso e que seus antepassados foram os fundadores da cidade.
Sua filosofia
Considerava a realidade do mundo e o próprio mundo como algo dinâmico, em permanente transformação. Para ele, a vida era um fluxo constante, impulsionado pela luta de forças contrárias[7], mas harmônicas ao mesmo tempo. Deste modo Heráclito coloca o fogo[8] como princípio (arché) e fundamento de tudo, que devia de ser feito da mesma coisa[9], tanto no caso do cosmo exterior ao homem quanto da alma.
Uma vez que Heráclito tomou o cosmo como que governado por um princípio de inteligência, não seria nada estranho que ele tivesse estabelecido uma analogia (comparação) –uma identidade mesmo- entre o fogo cósmico e a chama da alma. O fogo representa a realidade dinâmica do mundo, com chamas vivas e eternas, governando o constante movimento dos seres[10].
É pela luta das forças opostas que o mundo se modifica e evolui. Nada neste nosso mundo é permanente. Tudo está mudando o tempo todo. Tudo flui: πάνπα ῥεῖ[11]. A mudança é a lei da vida e do Universo. Não devemos deduzir que Heráclito defendeu uma teoria da mudança contínua desregrada; ao contrário, ele entendia que havia lógica, o Logos[12], governando tal mudança. O logos é a lei universal e fixa, regedora de todos os acontecimentos particulares e, fundamentalmente, da harmonia universal feita de tensões.
            Há no universo, como podemos perceber, um incessante combate, e há também uma estabilidade relativa das coisas, devido às diferentes proporções do fogo, que se inflama ou se extingue conforme segundo medidas mais ou menos iguais. E estas proporções, junto com o equilíbrio dos dois caminhos, descendente e ascendente[13], constituem o que chama Heráclito: a ‘oculta harmonia do cosmos’. Há uma harmonização de tensões opostas, semelhante a que se dá entre o arco e a lira ao ser afinada.
            Para Heráclito a realidade é uma e única; porém, ao mesmo tempo é múltipla, e isto não acontece de um modo que apresenta contínuas transformações. Para que exista o Uno, é essencial que seja, por sua vez, uno e múltiplo ao mesmo tempo, identidade na diferença, unidade na diversidade.

            Heráclito fala do Uno chamando-o Deus e sábio: “O Uno, o único sábio, recusa e aceita ser chamado de Zeus”. Deus[14] é a Razão (Λόγος) universal que rege todas as coisas, que sujeita todos os seres a uma unidade e determina as constantes transformações do universo.

            A razão humana é um momento desta razão universal[15], uma forma de manifestação da sabedoria divina. Ao homem cabe esforçar-se para viver conforme a razão que estabelece a Lei inalterável do universo, contentando-se e não se rebelando contra Deus, pois o processo é expressão do Logos incompreensível, que tudo ordena por sua Lei. A razão e a consciência do homem –o elemento ígneo- é o que ele tem de mais importante: quando o fogo puro abandona o corpo, a água e a terra restantes são desprovidos de valor; este pensamento é expresso por Heráclito quando ele diz: “os cadáveres deveriam ser lançados como esterco” (é o fragmento). Interessa, pois, ao homem conservar sua alma num estado mais seco possível: “O seco é o mais sábio e melhor” (é o fragmento). Para as almas pode ser agradável umedecer-se, porém, “para as almas é morte converter-se em água” (é o fragmento). As almas hão de lutar para elevar-se acima dos mundos particulares do “sonho”, para alcançar o mundo comum da “vigilância”, que é o mundo comum do pensamento e da razão, em outras palavras: aproximar-se da divindade é viver segundo a razão. É pelo esforço insistente em guiar-se pela razão que o homem participa da Lei universal, a Razão, o Uno, Logos (Λόγος).
            Concluímos, portanto, que Heráclito de Éfeso concebeu uma genuína noção filosófica, ainda que por um caminho de simbolização sensível (fogo, seco, úmido, etc,.) semelhante aos seus predecessores jônios, e esta noção do Uno com essencialmente múltiplo se distingue sob a simbolização do sensível.

            Demócrito de Abdera – Escola atomista (460-370)
       Demócrito nasceu provavelmente em 460 a.C. e morreu em 370 a.C., mas há muita incerteza com relação a estas datas. Foi o mais viajado dos filósofos pré-socráticos, tendo visitado a Babilônia, o Egito e, segundo alguns autores, a Índia e a Etiópia. Depois, esteve também em Atenas. Discípulo de Leucipo e chefe da escola, escreveu numerosas obras, embora não haja certeza de serem todas de sua autoria, mas todas se perderam.
       Os atomistas são os últimos pré-socráticos. Chegam a ser contemporâneos de Sócrates, mas continuam na tradição que se preocupa com a physis (natureza) e, sobretudo, na linha da filosofia eleática. Os dois principais atomistas foram Leucipo e Demócrito, sendo que nada se sabe de especial com relação à Leucipo, apenas que foi o precursor da teoria atomista.
Tudo o que existe é constituído de átomos  que são partículas indivisíveis e invisíveis, eternas e imutáveis; não têm qualidades, exceto a impenetrabilidade; diferem entre si apenas pela figura e pela dimensão e todo átomo possui tamanho, forma e peso.
Existe apenas o átomo e o vazio. Todos os átomos, sendo corpos minúsculos, não possuem qualidades sensíveis, e o vazio é o espaço que tais corpúsculos se movimentam para cima e para baixo eternamente ou se entrelaçando de diversas maneiras, ou se chocando e ricocheteando, de modo a irem se desagregando e agregando em tais compostos; e, desta forma, produzem todas as maiores agregações e os nossos corpos e as maiores afeições.
Nenhum átomo pode aquecer-se ou resfriar-se, ressecar-se ou umedecer-se, tornar-se branco ou preto ou receber outras qualidades por qualquer modificação que se queira.
A terra é constituída por átomos mais volumosos, os quais, no turbilhão do movimento, se reuniram no centro do universo, constituindo a massa homogênea que chamamos Terra.
A alma humana é formada por átomos leves e sutis, os quais são ígneos, isto é, semelhantes aos que constituem o fogo.
Também os deuses são feitos de átomos. A sua superioridade é devida a uma constituição atômica mais perfeita e a uma duração mais longa. Mas nem os deuses são imortais. Isto porque tudo –deuses, homens, coisas- está sob a fatalidade do movimento que associa ou dissocia os átomos.
O conhecimento é descrito por Demócrito como uma captação, por parte dos órgãos sensitivos, dos átomos irradiados pelos corpos. A diversidade da sensação depende das formas diferentes dos átomos. O doce, por exemplo, é causado “por átomos redondos e de tamanho razoável”, o azedo “por átomos agudos e angulosos”, etc.
Com esta doutrina aparece pela primeira vez na cena da história da filosofia uma teoria de capital importância, a qual ensina que qualidades como odor, sabor, cor, etc,. não são objetivas, mas subjetivas. Assim, por exemplo, a cera, em si mesma, não é nem doce nem amarga, nem branca nem amarela; essas qualidades são decorrentes do encontro dos átomos da cera, em suas características quantitativas, com o sentido do gosto e da vista do homem. Isto explica, segundo Demócrito, por que a mesma coisa seja doce para uns e amarga para outros, branca para estes e amarela para aqueles: depende dos órgãos dos sentidos de cada um.
Demócrito foi o primeiro a dar atenção à origem da linguagem. Eis sua explicação: “No começo os homens emitiam sons não articulados e destituídos de significado; mais tarde, aos poucos, começaram a articular palavras e estabeleceram entre eles expressões convencionais para designarem os objetos e assim criaram a linguagem”.
Quanto à moral, Demócrito não coloca a felicidade no prazer dos sentidos, mas na harmonia da razão e na paz da alma (tanquilitas animi). Se se ouvirem com entendimento estas minhas sentenças, muitas ações dignas de um homem excelente serão praticadas e muitas más ações serão evitadas (é o fragmento).

FASE ANTROPOLÓGICA Escola sofista – Górgias e Protágoras (σοφιστής)

O contexto
A vitória dos gregos sobre os persas deu a Atenas a hegemonia sobre o mar Egeu, enquanto a democracia vitoriosa teve um grande desenvolvimento com a crescente importância das assembléias e dos tribunais, das discussões sobre os temas da moral, da política, etc. Tais circunstâncias acarretam a maior preocupação quanto aos problemas humanos (antropológicos), pois as instituições e as crenças do passado eram agora insuficientes para responder às novas perguntas que surgiam. Desenvolveu-se, assim, uma cultura de valor prático, que se preocupava pelas coisas humanas. Uma cultura dialética[16], que não encontrava mais, no âmbito das velhas concepções filosóficas, uma resposta às suas novas perguntas, levou filósofos a penetrarem em novo terreno: o homem. A fase cosmológica da Filosofia é agora substituída pela fase antropológica. Foi quando surgiu um grande número de mestres, hábeis oradores, expositores de doutrinas, que encontravam o apoio da juventude que os acompanhava, que, com eles, aumentava seus conhecimentos. São os sofistas. Admirados pelos que os pagavam para que lhes ensinassem a arte de argumentar e de discutir, não formavam propriamente uma corrente filosófica, pois havia entre eles de todas as tendências. O que os caracterizava, porém, era a exaltação que davam ao homem como indivíduo.
Apesar disso, eram os sofistas desprezados pelos aristocratas do saber, pelos filósofos. Para darmos uma ideia do conceito que gozavam junto aos filósofos, basta que citemos estas palavras de Aristóteles: "Realmente, a sofística é uma sabedoria aparente, não real, porém; e o sofista é um traficante de sabedoria aparente, não porém real". Entre os sofistas aparecem, como duas figuras exponenciais, as personalidades de Protágoras e de Górgias, cujas doutrinas passaremos a expor.

Origem e objetivos da sofística
A filosofia pré-socrática chega ao seu apogeu com a sofística, movimento de ideias que se desenvolve no mundo grego durante o século V a.C.
Diversamente das escolas filosóficas precedentes, a sofística não tem uma localização geográfica bem definida: seus seguidores procedem tanto da Itália meridional como da Ásia Menor, tanto da Sicília como da Grécia. A novidade mais importante da sofística é que ela desperta um interesse, por assim dizer, geral, não só nas colônias, mas também na mãe pátria, principalmente em Atenas, que, depois das duas vitórias de maratona sobre os persas (490 e 475), se impõe como maior centro político e cultural da Grécia.
O aparecimento da sofística deve-se a razões de ordem filosófica e política.
Primeiramente de ordem filosófica. As mentes mais esclarecidas tinham pesquisado a causa primeira das coisas, mas as conclusões a que tinham chegado eram totalmente contrastantes (diferença ou oposição entre coisas da mesma natureza): alguns filósofos identificaram o princípio eterno e vital de tudo o que existe num elemento da natureza, outro o ápeiron, outro o átomo, etc. Diante desse quadro pouco animador, é lógico que os pensadores do século V julgassem inútil insistir na pesquisa cosmológica.
Os sofistas procuravam reunir primeiro uma grande coletânea de observações, acumulavam dados e tiravam suas conclusões, uma parte delas práticas e outras teóricas.
Os primeiros filósofos gregos, por sua vez, haviam se ocupado, principalmente, em encontrar o princípio eterno e vital que constitui o universo e apresentar explicações coerentes sobre a geração das coisas, mas as sucessivas hipóteses propostas pelos primeiros filósofos provocaram descrédito quanto à busca por esse princípio, pois uma diversidade de hipóteses doutrinais demonstra que não há consenso em saber qual seria esse princípio eterno e vital, a consequência é o ceticismo diante desconfiança para com as cosmologias.
Muda-se o foco de interesse de pesquisa que agora é essencialmente humanística e gnosiológica (o que o homem pode conhecer?).
Contribuíram para o aparecimento da sofística, além de razões de ordem filosófica, também exigências de ordem política, típicas da cidade grega desse período. A vida na pólis exigia de todos os cidadãos que se dedicavam à vida política (o que faziam todos os membros da aristocracia) uma razoável cultura e certa facilidade na eloquência, isto por causa da enorme importância das assembléias públicas, nas quais eram tratadas as mais variadas questões como a guerra e a paz, o direito e o conceito, o governo e a religião, etc. A educação tradicional não estava em condições de satisfazer a exigências tão variadas e avançadas para se refletir sobre os fenômenos da civilização e da cultura. Fazia-se necessário uma instrução mais profunda e especializada. Aparece então a figura do sofista. Ele se atribui o encargo de instruir os filhos da aristocracia na gramática, na literatura, na filosofia, na religião e principalmente na retórica, que, como diz Platão, “é o entendimento das coisas da família, de modo que se possa administrar otimamente a própria casa, e das coisas da cidade, de modo que se alcance, na cidade, o poder tanto de realizar como de discorrer[17]”.

Principais ensinamentos dos sofistas
Devido à vasta gama de ensinamentos sofísticos destacaremos aqueles que se referem à teoria do conhecimento.
Havia uma crise profunda na filosofia grega devido à contraditoriedade das múltiplas soluções propostas para os problemas do princípio eterno e vital de tudo o que existe, do sentido da vida humana e do valor da lei moral.
Doutrinas principais: os sofistas levantaram pela primeira vez a questão de se o homem tinha ou não a capacidade de conhecer a íntima natureza das coisas (princípio eterno e vital de tudo o que existe) e a lei moral absoluta (a ética e os valores morais válidos para toda e qualquer situação do agir humano). Sua resposta foi a de que o homem não as pode conhecer, porque a realidade e a lei natural estão acima da capacidade cognoscitiva do homem. Portanto, tudo aquilo que o homem conhece em filosofia e em ética é de sua própria elaboração. Daí a famosa expressão dos sofistas: “o homem é a medida de todas as coisas”. Com efeito, não é possível um conhecimento verdadeiro, mas apenas provável; não há uma lei moral absoluta, mas somente leis convencionais. Nesta dimensão empírica do conhecimento humano, o prazer se coloca como a única meta para o homem.
A sofística se diferenciou da filosofia grega anterior pelo objeto de que se ocupava, a saber, o homem (questões antropológicas), sua civilização e seus costumes: tratava do microcosmo melhor do que o macroscosmo. O homem começava a adquirir consciência de si. Como disse Sófocles: Muitos são os mistérios que há no universo, mas não há maior mistério que o homem.

PROTÁGORAS (480-410 a.C.)
Nascido provavelmente em 481 a.C. em Abdera, na Trácia, transferiu-se bastante jovem para Atenas, onde ensinou a uma densa multidão de alunos entusiastas. Ganhou a estima e o favor de Péricles, que o encarregou de redigir a constituição da colônia de Túrio. A data de sua morte é desconhecida.
Protágoras afirmou a relatividade do conhecimento. ("O homem é a medida de todas as coisas, das que são, enquanto são, e das que não são, enquanto não são"). Entre os homens, dão-se opiniões contrárias; por isso as coisas podem ser verdadeiras e falsas, havendo, assim, identidade entre o verdadeiro e o falso. Os ensinamentos de Protágoras trouxeram, como conseqüência, a relatividade das valorações éticas, estéticas e cognoscitivas. O situar o homem no centro de toda consideração trouxe, como consequência, que os estudos se ativessem no que se referia ao estritamente humano. Os sofistas, apesar de todos os defeitos de que os acusam, representam, na história da filosofia, um grande papel.
De qualquer forma, é inegável o significado antropocêntrico da doutrina de Protágoras: não existe verdade absoluta; o homem interpreta os dados dos sentidos a seu modo e de acordo com seus interesses. O sábio, isto é, o sofista, usando a arte da persuasão, consegue fazer com que apareçam como melhores não as opiniões mais próximas a verdade, mas as mais vantajosas.

GÓRGIAS (485-375 a. C.)
Górgias de Leontinos foi um grande retórico e notável orador.

A retórica. Técnica de persuasão e suas articulações
No regime democrático que vigorava em Atenas, o exercício da função política dependia do bom uso da palavra. E os sofistas foram mestres na arte de bem falar, tanto em discursos longos quanto breves (perguntas e respostas).
Platão viu, nesse ensino sofistico um perigo para a cidade. A principal razão de sua má vontade em relação à retórica sofística parece ter sido o fato de ser ela uma técnica puramente formal de persuasão. O bom orador é aquele que sabe persuadir qualquer um de qualquer coisa.
(Górgias, professor de retórica, está sendo interrogado por Sócrates sobre a sua arte).

Górgias: - ... a retórica, por assim dizer, abrange o conjunto das artes, que ela mantém sob sua autoridade. Vou apresentar-te uma prova eloqüente disso mesmo. Por várias vezes fui com meu irmão ou com outros médicos à casa de doentes que recusavam a ingerir remédios ou a se deixar amputar ou cauterizar; e, não conseguindo o médico persuadi-lo, eu o fazia com a ajuda exclusiva da arte da retórica. Digo mais: se, na cidade que quiseres, um médico e um orador se apresentarem a uma assembléia do povo ou a qualquer outra reunião para argumentar sobre qual dos dois deverá ser escolhido como médico, não contaria o médico com nenhuma probabilidade para ser eleito, vindo a sê-lo, se assim o desejasse, o que soubesse falar bem. E se a competição se desse com representantes de qualquer outra profissão conseguiria fazer eleger-se o orador de preferência a qualquer outro, pois não há assunto sobre que ele não possa discorrer com maior força de persuasão diante do público do que qualquer profissional. Tal é a natureza e a força da arte da retórica! ... É fora de dúvida que o orador é capaz de falar contra todos a respeito de qualquer assunto, conseguindo, por isso mesmo, convencer as multidões melhor do que qualquer outra pessoa, e, para dizer tudo, no assunto que bem lhe parecer.

            SÓCRATES
            Sócrates (c.470-399 a.C.) nada deixou escrito, e teve suas idéias divulgadas por dois de seus principais discípulos, Xenofonte e Platão. Evidentemente, devido ao brilho deles, é de se supor que nem sempre fossem realmente fiéis ao pensamento do mestre. Nos diálogos que Platão escreveu, Sócrates figura sempre como o principal interlocutor.
            Sócrates se indispôs com os poderosos do seu tempo, sendo acusado de não crer nos deuses da cidade e corromper a mocidade. Por isso foi condenado e morto.
        Costumava conversar com todos, fossem velhos ou moços, nobres ou escravos, preocupado com o método do conhecimento. Sócrates parte do pressuposto "só sei que nada sei", que consiste justamente na sabedoria de reconhecer a própria ignorância, ponto de partida para a procura do saber.
        Por isso seu método começa pela parte considerada "destrutiva", chamada ironia (em grego, perguntar"), entre os gregos a ironia não era uma forma literária, mas uma atitude do espírito considerada detestável.
            No livro IV da Ética a Nicômaco, Aristóteles, definindo a virtude da veridicidade, considera-a o justo meio entre a jactância (arrogância, vaidade) e a ironia. O irônico peca contra a veridicidade porque, em seus discursos, se recusa a revelar suas qualidades, oculta seu saber sob a capa de uma ignorância fingida e se protege atrás de um comportamento puramente negativo. Não é difícil de reconhecer que esta é a ironia usada por Sócrates, e é natural que os seus contemporâneos o tenham condenado por causa dela, mesmo tendo ele sabido transformar a ironia em um método de educação, em um processo pedagógico e filosófico.
            Nas discussões afirma inicialmente nada saber, diante do oponente que se diz conhecedor de determinado assunto. Com suas perguntas, Sócrates deixa embaraçado e perplexo aquele que está seguro de si mesmo, faz-lhe ver novos problemas e desperta a sua curiosidade e estimula-o a refletir, desmonta as certezas até o outro reconhecer a ignorância. Parte então para a segunda etapa do método, a maiêutica (em grego, "parto"). Dá esse nome em homenagem a sua mãe, que era parteira, acrescentando que, se ela fazia parto de corpos, ele "dava à luz" idéias novas.
            Sócrates, por meio de perguntas, destrói o saber constituído para reconstruí-lo na procura da definição do conceito. Esse processo aparece bem ilustrado nos diálogos relatados por Platão, e é bom lembrar que, no final, nem sempre Sócrates tem a resposta: ele também se põe em busca do conceito e às vezes as discussões não chegam a conclusões definitivas.
            As questões que Sócrates privilegia são as referentes à moral, daí perguntar em que consiste a coragem, a covardia, a piedade, a justiça e assim por diante. Diante de diversas manifestações de coragem, quer saber o que é a "coragem em si", o universal que a representa. Ora, enquanto a filosofia ainda é nascente, precisa inventar palavras novas, ou usar as antigas dando lhes sentido diferente. Por isso Sócrates utiliza o termo logos, que na linguagem comum significava "palavra", "conversa", e que no sentido filosófico passa a significar "a razão que se dá de algo", ou mais propriamente, conceito.
            Por razões de método (e não por incapacidade de Sócrates), seus diálogos levantam uma questão, mas não dão a solução. Servem para por o interrogado no caminho da solução para que ele mesmo a encontre. Solução difícil porque, tratando-se de problemas morais, exige muitas vezes uma conversão.

            PLATÃO
            Platão (428-347 a.C.) viveu em Atenas, onde fundou uma escola denominada Academia.
            Para melhor sintetizar as idéias de Platão, recorremos ao livro VII de A República, onde seu pensamento é ilustrado pelo famoso "mito da caverna". Platão imagina uma caverna onde estão acorrentados os homens desde a infância, de tal forma que, não podendo se voltar para a entrada, apenas enxergam o fundo da caverna. Aí são projetadas as sombras das coisas que passam às suas costas, onde há uma fogueira. Se um desses homens conseguisse se soltar das correntes para contemplar a luz do dia os verdadeiros objetos, quando regressasse, relatando o que viu aos seus antigos companheiros, esses o tomariam por louco, não acreditando em suas palavras.
            A análise do mito pode ser feita pelo menos sob dois pontos de vista: o epistemológico (relativo ao conhecimento) e o político (relativo ao poder).
            Segundo a dimensão epistemológica, o mito da caverna é uma alegoria a respeito das duas principais formas de conhecimento: na teoria das idéias, Platão distingue o mundo sensível, dos fenômenos, e o mundo inteligível, das idéias.
            O mundo sensível, acessível aos sentidos, é o mundo da multiplicidade, do movimento, e é ilusório, pura sombra do verdadeiro mundo. Assim, mesmo se percebemos inúmeras abelhas dos mais variados tipos, a idéia de abelha deve ser una, imutável, a verdadeira realidade.
            Do seu mestre aproveita a noção nova de logos, e continuando o processo de compreensão do real, cria a palavra idéia (eidos), para referir-se à intuição intelectual, distinta da intuição sensível.
            Portanto, acima do ilusório mundo sensível, há o mundo das idéias gerais, das essências imutáveis que o homem atinge pela contemplação e pela depuração dos enganos dos sentidos.
            Sendo as idéias a única verdade, o mundo dos fenômenos só existe na medida em que participa do mundo das idéias, do qual é apenas sombra ou cópia. Por exemplo, um cavalo só é cavalo enquanto participa da idéia de “cavalo em si”. Trata-se da teoria da participação, mais tarde duramente criticada por Aristóteles.
        Para Platão há uma dialética que fará a alma elevar-se das coisas múltiplas e mutáveis às idéias unas e imutáveis. As idéias gerais são hierarquizadas, e no topo delas está a idéia do Bem, a mais alta em perfeição e a mais geral de todas: os seres e as coisas não existem senão enquanto participam do Bem. E o Bem supremo é também a Suprema Beleza. É o Deus de Platão.
            Mas como é possível aos homens ultrapassarem o mundo das aparências ilusórias? Platão supõe que os homens já teriam vivido como puro espírito quando contemplaram o mundo das idéias. Mas tudo esquecem quando se degradam ao se tornarem prisioneiros do corpo, que é considerado o "túmulo ou prisão da alma". Pela teoria da reminiscência, Platão explica como os sentidos se constituem apenas na ocasião para despertar nas almas as lembranças adormecidas. Em outras palavras, conhecer é lembrar. No diálogo Menon, Platão descreve como um escravo, ao examinar figuras sensíveis que lhe são oferecidas, é induzido a "lembrar-se" das idéias e descobre uma verdade geométrica.
        Voltando ao mito da caverna: o filósofo (aquele que se libertou das correntes), ao contemplar a verdadeira realidade e ter passado da opinião (doxa) à ciência (episteme), deve retornar ao meio dos homens para orientá-los.
        Eis assim a segunda dimensão do mito, a política, surgida da pergunta: como influenciar os homens que não vêem? Cabe ao sábio ensinar e governar. Trata-se da necessidade da ação política, da transformação dos homens e da sociedade, desde que essa ação seja dirigida pelo modelo ideal contemplado.



[1] A água é o princípio de todas as coisas: Não propriamente a água, mas o úmido. Há, inegavelmente, em Tales, a influência das doutrinas egípcias. A água (do Nilo) é a criadora da terra fértil do Delta. Além disso, havia, nessa época, convicção de que a terra estava cercada de água. Tal doutrina deriva, também, de uma longa e primitiva tradição mitológica das teogonias, e cosmogonias do Oriente antigo, sumério, caldeu, hebreu, fenício, egípcio, egeu, onde todos falam do "caos aquoso". A causa motora de todas as coisas é a alma, a potência divina, que põe tudo em movimento e penetra no úmido elementar. A Terra navega sobre a água. O mundo "está cheio de deuses". Chamou-se hilozoísmo a essa animação e vivificação da matéria, de hylê (matéria) e zoe (vida). Com Tales se processa a separação da filosofia dominada pela teogonia (gonia-origem; teo-Deus, ou pode ser deuses. Então trata-se da origem do mundo a partir dos deuses ou de um Deus) anterior (SANTOS. M. F. dos: Logos, p. 105).
[2] Na atuação dos jônicos, há a tendência para relacionar os fenômenos mais transcendentes aos fatos familiares, afastando-se, assim, quanto possível, do aspecto misterioso que tinham as crenças anteriores. É por isso que os jônicos são considerados propriamente mais físicos do que filósofos. Os problemas, que mais afetavam os interesses econômicos dos povos jônicos, absorviam mais detidamente a atenção de seus filósofos, sobretudo, como os que se referiam à meteorologia, naturalmente por se tratar de um povo de navegadores. Observa-se, na obra dos jônicos, a preocupação maior para o mar, grande tema de suas investigações. Não só o mar como o ar, as nuvens, as chuvas, as tempestades. A cosmologia jônica impregna-se do espetáculo das tormentas. A concepção do caos, onde existem semelhanças (SANTOS. M. F. dos: Logos, p. 107).
[3]   Não nos parece conveniente elaborar um comentário sobre este texto porque se trata de uma suposição, mas não podemos deixá-la fora do alcance do aluno, pois podemos penetrar no contexto da época e percebermos a importância da mitologia (dos deuses) para aquele povo e de como isso influencia de forma direta até a forma de pensarmos sobre a vida, o universo e nossas relações pessoais.
[4] Todos os sistemas filosóficos seguintes contêm em sua natureza, em sua essência o princípio “Tudo é um”. Há, no movimento jônico, a preocupação do conhecimento da substância primeira (arque), primordial e eterna, fonte de todas as coisas. É o conceito do absoluto, a eterna busca de todas as filosofias.
[5] Anaxímenes segue a mesma estrutura de pensamento de Tales quanto ao princípio vital.
[6] Do ar dizia que nascem todas as coisas existentes, as que foram e as que serão, os deuses e as coisas divinas (Hip., Ref. I, 7).
[7] Toda transformação envolve os contrários, quente e frio, seco e úmido. Realmente, sem um dos contrários o outro não existiria, e sem os contrários não existiria o cosmos (é o fragmento).
[8] Para Heráclito, o fogo é o elemento primordial, mas não como um elemento natural (da Natureza), no sentido literal do termo, e sim no sentido de algo em mudança contínua, em constante transformação.
O fogo é gerador do processo cósmico (é o fragmento)
[9]Se o fogo se alimenta das coisas, transformando-as, tanto lhes dá como lhes toma. “Todas as coisas se transformam em fogo e o fogo em todas as coisas, é o mesmo que transformar o ouro por mercadorias e mercadorias por ouro” (é o fragmento).
[10] Este mundo é igual para todos, nenhum dos deuses e nenhum dos homens o fez; sempre foi, é e será um fogo eterno vivo, acendendo-se e apagando-se conforme a medida (é o fragmento).
[11] O fogo vive a morte da terra e o ar vive a morte do fogo; a água vive a morte do ar e a terra da água.
[12] Heráclito diz que o fogo periódico e eterno (é Deus). O destino é a lei universal (Logos), e forma as coisas em conseqüência do movimento dos contrários. Tudo obedece ao destino. E ele é idêntico à necessidade (Aet. I, 7, 22).
Só uma coisa é sábia: conhecer o pensamento que governa tudo através de tudo (é o fragmento).
[13] Heráclito dizia que o fluir, a transformação das coisas segue duas vias, uma para baixo (descendente) e outra para cima (ascendente) e que em virtude destas transformações é que o mundo, o cosmos, existe. Descrevemos as vias deste modo: O fogo, ao condensar-se, se umedece, e, comprimido, se converte em água; a água ao congelar-se, se transforma em terra. A isto chamamos a via para baixo (descendente). Vice-versa, a terra se torna líquida e dela sai a água, e da água todos os demais elementos num estado de rarefação, deste modo entendemos por que o fogo alimenta-se do úmido e por que o mar evapora. Esta via é chamada (ascendente) para baixo.
[14] O logos é entendido como inteligência divina que governa o real.
[15]  A sabedoria humana liga-se ao Logos (é o fragmento)
[16] Dialética em sentido dialógico: todo e qualquer questionamento deve-se apresentar argumentação sólida e aquele que discute deve persuadir e apresentar a melhor argumentação, que consiste em preparação, saber concatenar as ideias e enfraquecer a argumentação do oponente.
[17] Platão, Protágoras.